RESUMO

Durante o período de 1985 a 1998, foram analisadas por métodos bacteriológicos, amostras de órgãos e anexos de 78 fetos suínos abortados, provenientes de granjas do Estado de São Paulo. Nos fetos examinados, foram isolados 29 (37,18%) agentes bacterianos: Actinomyces pyogenes (5,13%), Arcobacter cryaerophilus (5,13%), Erysipelothrix rhusiopathiae (5,13%), Staphylococcus spp (não aureus) (3,85%), Escherichia coli ( hemolítica) (3,85%), Escherichia coli (3,85%), Brucella suis (2,56%), Streptococcus spp ( hemolítico) (2,56%), Streptococcus spp (a hemolítico)+ Escherichia coli ( hemolítica) (2,56%), Leptospira spp (1,28%), Escherichia coli + Enterobacter aerogenes (1,28%). Em 49 espécimens (62,82%) não foram isoladas bactérias através dos métodos empregados, atribuindo-se à etiologia destes abortamentos outras causas não pesquisadas, como as de origem viral, parasitárias ou não infecciosas. Neste estudo, observou-se a susceptibilidade da espécie suína a diversos gêneros bacterianos, desde os normalmente relacionados a distúrbios reprodutivos como Brucella, Leptospira e Actinomyces até bactérias de patologias primariamente reconhecidas como não abortivas como o Erysipelothrix rhusiopathiae. Destaca-se o isolamento de Arcobacter cryaerophilus como uma das bactérias mais freqüentemente associadas aos abortamentos nos suínos examinados, embora os mecanismos de patogenicidade ainda não tenham sido totalmente elucidados Verificam-se também, grupos de bactérias oportunistas ou potencialmente patogênicas, como as enterobactérias e os cocos gram-positivos.

PALAVRAS-CHAVES:
Suíno; abortamento; diagnóstico bacteriológico.

ABSTRACT

PERIOD 1985 TO 1998. During 1985 to 1998, 78 samples of aborted fetuses, organs and anexus, were bacteriologicaly examined. These specimens carne from swine herds from São Paulo State, Brazil The results showed 29 (37.18%) bacterial agents: Actinomyces pyogenes (5.13%), Arcobacter cryaerophilus (5.13%), Erysipelothrix rhusiopathiae (5.13%), Staphylococcus spp (3.85%), Escherichia coli ( haemolitic) (3.85%), Escherichia coli (3.85%), Brucella suis (2.56%), Streptococcus spp ( haemolitic) (2.56%), Streptococcus spp (a haemolitic) + Escherichia coli ( haemolitic) (2.56 %), Leptospira spp (1.28%), Escherichia coli + Enterobacter aerogenes (1.28%). There were 49 (62.82%) specimens not isolated. through the methods employed. In these cases, the abortion etiology could be due to other causes not studied, such as virai, parasitic or not infectious origins. In this study, the high swine susceptibility to several bacterial genera, other than those usually related to reproductive disturbances, as Brucella, Leptospira and Actinomyces, were presented. The authors discussed the isolation of Arcobacter cryaerophilus as one of the most frequent bacteria associated to the abortions in this study, although the pathogenicity mechanism has not been yet elucidated. Erysipelothrix rhusiopathiae, not recognized as an abortive primary cause, was found in four events. There was also observed the presence of opportunistic bacteria and potentially pathogenic groups, such as enterobacteria and gram-positive coccus.

KEY WORDS:
Swine; abortions; bacteriological diagnosis.

INTRODUÇÃO

Natimortos, fetos mumificados, abortamentos e morte embrionária precoce refletem substancial impacto na lucratividade de uma granja, tanto em condições epidêmicas quanto endêmicas. A morte fetal é altamente dependente do estágio de gestação, sendo que os abortamentos estão mais diretamente relacionados ao adequado controle materno da prenhez, do que à insuficiência fetal (CHRISTIANSON, 1992).

A etiologia de abortamentos em suínos é bastante ampla, variando desde alterações embrionárias ou fetais, stress ambiental, alimentos contaminados por determinadas espécies de fungos, deficiências vitamínicas, doenças do aparelho locomotor, síndrome do abortamento do outono, até enfermidades de origem infecciosa. Dentre estas, destacam-se Doença de Aujeszky (DA), Parvovirose Suína (PVS), Peste Suína Clássica (HC), Síndrome Respiratória e Reprodutiva dos Suínos (SRRS), Leptospirose, Brucelose, Clamidiose e Campilobacteriose (CARTER, 1990; KIRKIBRIDE, 199l;FERREIRA NETO, et al. 1997; SCHILEER et al.,1997; ROSSOW et al.,1998).

Raros relatos de abortamentos causados por outros gêneros bacterianos são descritos na literatura. Nos Estados Unidos, ONET & POMMER (1991) descreveram cinco casos de abortamento por Staphylococcus hyicus, KIRKIBRIDE et al. (1986) quatro casos por Bacillus spp. Estirpes de Arcobacter spp foram isoladas de 43% dos 30 casos de abortamento pesquisados em granjas do Estado de Iowa (SCHROEDER-TUCKER-L, 1996). Na Hungria, FODOR et al. (1990) e FODOR et al. (1991) isolaram onze estirpes de Actinobacillus spp e três de Pasteurella aerogenes, respectivamente.

No Brasil, também são escassos os trabalhos que descrevem a etiologia de abortamentos na espécie suína, principalmente quanto à pesquisa simultânea de diversos gêneros bacterianos, tanto clássicos como oportunistas, esporadicamente citados como causa de abortamento em suínos.

SANTA ROSA et al. (1970) isolaram conjuntamente Leptospira interrogans sorotipo icterohaemorrhagiae e Brucella suis biotipo 1 de um feto suíno oriundo do Município de Pirassununga, Estado de São Paulo e SANTA ROSA et al. (1973) isolaram Leptospira interrogans sorotipo pomona e Bruce/la suis de cinco fetos suínos do Estado de Santa Catarina. No Rio Grande do Sul, OLIVEIRA et al. (1983) isolaram duas estirpes de Leptospira sorotipo pomona de dois fetos de duas granjas e OLIVEIRA et al. (1995) relataram o isolamento de Arcobacter cryaerophilus a partir de seis fetos suínos abortados de duas propriedades que apresentavam casos de abortamento.

O presente trabalho tem por objetivo pesquisar a presença de microrganismos aeróbios e microaerófilos, incluindo Leptospira spp, Bruce/la spp e Campylobacter spp, que possam estar envolvidos na etiologia bacteriana dos abortamentos em rebanhos suínos do Estado de São Paulo.

MATERIAL E MÉTODOS

No período de 1985 a 1998, foram examinadas amostras de órgãos e anexos de 78 fetos abortados suínos das raças Large White, Duroc e Landrace, provenientes de granjas do Estado de São Paulo (Auriflama, Bauru, Bom Jesus dos Perdões, Bragança Paulista, Campinas, Campo Limpo Paulista, Carapicuíba, Caximba, Descalvado, Franca, Holambra, Ibitinga, Itatiba, Louveira, Marília, Mogi Mirim, Monte Alto, Nova Odessa, Paranapanema, Pirassununga, Salto, Santo Antônio da Posse, São Paulo e Valinhos)

Essas amostras foram cultivadas de tal forma a permitir o isolamento e a identificação de vários gêneros bacterianos aeróbios e microaerófilos. O processamento bacteriológico constituiu-se de (GENOVEZ et al, 1993):

1. O conteúdo gástrico foi subdividido em alíquotas, assim cultivadas:

a. Para microaerófilos (Campylobacter spp, Brucella spp): em ágar Brucella (Difco) acrescido de 10% de sangue de carneiro com e sem adição de mistura antibiótica (polimixiha B - 10.000 UJ/1, bacitracina -15.000 UJ/1, novobiocina-0,005 g/L e cicloheximida - 0,Q2 g/1), incubado elll atmosfera de 95% N2 +5% CO2 + O2 residual, a 37 ºCpor até 7 dias;

b. Para aeróbios e enterobactérias:em ágar Brucella (Difco) acrescido 10% de sangue de carneiro e em ágar EMB - Levine (Difco), incubados em aerobiose a 37ºC por 48 horas;

c. Para Leptospira interrogans e Arcobacter cryaerophilus: em meio de Fletcher (Difco) acrescido de 10% de soro inativado de coelho, incubados em aerobiose a 30ºC por até 30 dias.

2. Os fragmentos de rins e/ou fígados foram macerados e seguiram o mesmo processo descrito em l.c.

3. Os fragmentos de placenta foram processados como descrito em 1 a, b e c.

As culturas foram identificadas, confo1me o agente suspeito, segundo Bergey's Manual of Determinative Bacteriology (HOLT et al., 1994).

Também para o diagnóstico da leptospirose foram utilizados decalques de rim e/ou fígado frente à técnica de imunofluorescência indireta, preparada para identificar os sorotipos icterohaemorrhagiae, can.icola, pomon.a, grippotyphosa, hardjo, wol.ffi, pyrogenes, javanica e tarassovi (GENOVEZ et al., 1990).

Foram consideradas como possíveis causas de abortamento as bactérias patogênicas e as culturas puras ou preponderantes de bactérias potencialmente patogênicas ou oportunistas. No caso da leptospirose foram considerados positivos os isolamentos e/ou a detecção de leptospiras pela reação de imunofluorescência indireta (GENOVEZ et al., 1993).

RESULTADOS

Dos 78 fetos examinados, em 29 (37,18%) foi diagnosticada a presença de diversos agentes bacterianos, como mostra a Tabela 1 .

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

Abortamentos em suínos geralmente ocorrem por volta de 109 dias de gestação, sendo que dentre as principais causas desencadeantes destacamse as falhas maternais e as enfermidades infecciosas. Nestas se incluem a brucelose e a leptospirose mais comumente detectadas e ainda as viroses como parvovirose, peste suína e doença de Aujeszky. Estudos apontam outros agentes oportunistas, como Streptococcus spp, Escherichia coli,

Thumbnail Tabela 1
Freqüência de isolamentos bacterianos em órgãos e anexos fetais de rebanhos de suínos provenientes do Estado de São Paulo examinados no período de 1985 a 1998.

Staphylococcus spp, Pseudomonas spp, Yersinia en.terocolitica, Actin.omyces pyogen.es e Pasteurella multocida, cujos abortamentos ocorrem de forma esporádica (KIRKIBRIDE, 1991). Taxas de abortamento de cerca de 1% podem ser consideradas esperadas dentro de uma propriedade de manejo sanitário adequado e são provavelmente decorrentes de "stress" ambiental, deficiências minerais até problemas com o aparelho locomotor. O diagnóstico etiológico clínico é sempre difícil, sendo necessário oexame laboratorial, peloqual cerca de 40% dos resultados são conclusivos (KIRKIBRIDE, 1991; SOBESTIANSKY etal., 1993).

Neste estudo, em 29 (37,18%) dos fetos observou-se a susceptibilidade da espécie suína a diversos agentes bacterianos, desde os normalmente relacionados a distúrbios reprodutivos como Brucella, Leptospira e Actin.omyces assim como, bactérias de patologias reconhecidas primariamente como não abortivas, tal como o Erysipelothrix rhusiopathiae (KIRKIBRIDE, 1990).

VerificamLse também grupos de bactérias oportunistas ou potencialmente patogênicas como as enterobactérias, Escherichia coli e En.terobacter aerogen.es, e os cocos gram-positivos Staphylococcus spp e Streptococcus spp. Acredita-se que a via ascendente seja a maneira pela qual estes microrganismos, que compõem a microbiota vaginal das fêmeas, possam atingir o feto em condições especiais de debilidade imunológica(CARTER, 1990; KIRKIBRIDE, 1991).

Além disso, destaca-se o isolamento de Arcobacter cryaerophilus como uma das bactérias mais freqüentemente associadas aos abortamentos nos suínos examinados, cujos mecanismos de patogenicidade ainda não foram totalmente elucidados (FERNANDEZ et al., 1995; SCHROEDERTUCKER et al.,1996; OLIVEIRA et al., 1997).

Em 49 (62,82%) espécimens não foram isoladas bactérias através dos métodos empregados, atribuindo-se à etiologia destes abortamentos outras causas não pesquisadas, como as de origem virai, parasitárias ou não infecciosas. BROLL et al. (1993), estudando 171 fetos de rebanhos suínos na Suíça, diagnosticaram 8,2% de abortamentos de origem bacteriana e também obtiveram elevado percentual (52%) de abortos cujas causas não puderam ser identificadas.

É importante que este estudo tenha continuidade, visando não só ampliar o conhecimento de que, além dos gêneros Brucella e Leptospira, existem outros aos quais os rebanhos suínos do Estado de São Paulo são susceptíveis, como também expandir estes estudos a outros estados do Brasil, permitindo assim uma abordagem epidemiológica mais abrangente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Histórico

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