Resumos

Objetivou-se, neste trabalho, analisar a estrutura diamétrica do componente arbóreo de um fragmento de Floresta Atlântica inserido em uma matriz de cana-de-açúcar, utilizando-se o quociente "q" de De Liocourt. O estudo foi realizado no fragmento denominado Mata das Caldeiras, no município de Catende, Pernambuco. Os indivíduos amostrados foram distribuídos em classes de diâmetro com amplitude de 5 cm, em que o centro da primeira classe tem o valor de 6,5 cm. Com o uso do quociente "q" de De Liocourt, aqui empregado, construíram-se as curvas de distribuição diamétrica, observadas e estimadas para a amostragem geral e para as espécies de maior Valor de Importância (VI). O fragmento Mata das Caldeiras apresentou déficit de árvores nas classes de diâmetro, geral e por espécies de maior VI, comparado a uma floresta balanceada. O quociente "q" de De Liocourt pode ser usado para avaliar estrutura diamétrica em fragmentos de Floresta Atlântica. Por meio da distribuição diamétrica e dos valores de "q" obtidos para o estágio de sucessão em que se encontram as áreas, pode-se inferir que o grau de perturbação nesses fragmentos ocorre de forma constante.

distribuição diamétrica; quociente de De Liocourt; floresta ombrófila

This work aimed to analyze the diametric structure of arboreous component in an Atlantic Rain Forest fragment using De Liocourt quotient "q". The study was carried out at the Atlantic Rain Forest fragment, called Mata das Caldeiras, in Catende municipality, Pernambuco State, Brazil. The sampled individuals were distributed in class diameters with amplitude of 5 cm, with the first class having a value of 6.5 cm. Using the quotient "q" of De Liocourt the curves of diametric distribution, observed and estimated, were constructed, for the whole fragment and for species of higher Importance Value (VI). The fragment Mata das Caldeiras showed a deficit of trees in the diameter classes, generally and for species of greater VI, compared with a balanced forest. The De Liocourt quotient "q" may be used to evaluate diametric structure in fragments of Atlantic Forest. By the diametric distribution and obtained values of "q", for the period of succession found in the areas, it can be inferred that the degree of disturbance in these fragments occurs in a consistant manner.

diametric structure; De Liocourt quotient; ombrophylous forest

GESTÃO E CONTROLE AMBIENTAL

Estrutura diamétrica de um fragmento de Floresta Atlântica em matriz de cana-de-açúcar, Catende, Pernambuco

Diametric structure of a fragment of Atlantic Rain Forest in sugarcane plantation, Catende, Pernambuco State, Brazil

Francisco T. Alves JuniorI; Rinaldo L. C. FerreiraII; José A. A. da SilvaII; Luiz C. MarangonII; Roberto F. Costa JuniorIII

IDoutorando do PPGCF/UFRPE, Bolsista CAPES, Rua Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos, CEP 52171-900, Recife, PE. Fone: (81) 3320-6289. E-mail: [email protected]

IIProfessor do Departamento de Ciência Florestal/UFRPE. Fone: (81) 3320-6289. E-mail: [email protected]; [email protected]; [email protected]

IIIMestre em Ciências Florestais/UFRPE. Fone: (81) 3320-6289. E-mail: [email protected]

RESUMO

Objetivou-se, neste trabalho, analisar a estrutura diamétrica do componente arbóreo de um fragmento de Floresta Atlântica inserido em uma matriz de cana-de-açúcar, utilizando-se o quociente "q" de De Liocourt. O estudo foi realizado no fragmento denominado Mata das Caldeiras, no município de Catende, Pernambuco. Os indivíduos amostrados foram distribuídos em classes de diâmetro com amplitude de 5 cm, em que o centro da primeira classe tem o valor de 6,5 cm. Com o uso do quociente "q" de De Liocourt, aqui empregado, construíram-se as curvas de distribuição diamétrica, observadas e estimadas para a amostragem geral e para as espécies de maior Valor de Importância (VI). O fragmento Mata das Caldeiras apresentou déficit de árvores nas classes de diâmetro, geral e por espécies de maior VI, comparado a uma floresta balanceada. O quociente "q" de De Liocourt pode ser usado para avaliar estrutura diamétrica em fragmentos de Floresta Atlântica. Por meio da distribuição diamétrica e dos valores de "q" obtidos para o estágio de sucessão em que se encontram as áreas, pode-se inferir que o grau de perturbação nesses fragmentos ocorre de forma constante.

Palavras-chave: distribuição diamétrica, quociente de De Liocourt, floresta ombrófila

ABSTRACT

This work aimed to analyze the diametric structure of arboreous component in an Atlantic Rain Forest fragment using De Liocourt quotient "q". The study was carried out at the Atlantic Rain Forest fragment, called Mata das Caldeiras, in Catende municipality, Pernambuco State, Brazil. The sampled individuals were distributed in class diameters with amplitude of 5 cm, with the first class having a value of 6.5 cm. Using the quotient "q" of De Liocourt the curves of diametric distribution, observed and estimated, were constructed, for the whole fragment and for species of higher Importance Value (VI). The fragment Mata das Caldeiras showed a deficit of trees in the diameter classes, generally and for species of greater VI, compared with a balanced forest. The De Liocourt quotient "q" may be used to evaluate diametric structure in fragments of Atlantic Forest. By the diametric distribution and obtained values of "q", for the period of succession found in the areas, it can be inferred that the degree of disturbance in these fragments occurs in a consistant manner.

Key words: diametric structure, De Liocourt quotient, ombrophylous forest

INTRODUÇÃO

Com a destruição acelerada das florestas tropicais, grande parte da biodiversidade presente nesses ecossistemas está se perdendo, antes mesmo que se tenha conhecimento de sua riqueza natural (Borém & Oliveira Filho, 2002). Neste sentido, Austregésilo et al. (2004), enfatizam a importância de realizar estudos em florestas a fim de propiciar o conhecimento e a manutenção da biodiversidade, além de viabilizar a exploração de seus produtos, bens e/ou serviços provenientes, de forma planejada e racional, garantindo o fluxo contínuo desses recursos, que vêm sendo explorados intensamente em todo o mundo, com o passar do tempo.

Gentry (1995) ressaltou a importância de estudos florísticos e estruturais para o entendimento dos diferentes ecossistemas florestais da região tropical procurando, neste sentido, obter o conhecimento taxonômico, qualitativo e quantitativo, além de compreender melhor o seu comportamento contribuindo, desta forma, para o conhecimento das florestas tropicais com vistas à conservação e preservação de áreas fragmentadas deste ambiente.

No tocante à estrutura de uma floresta, Pires-O'brien & O'brien (1995) relatam que esta pode ser explicada pela distribuição diamétrica, a qual é definida pela caracterização do número de árvores por unidade de área e por intervalo de classe de diâmetro.

Paula et al. (2004) afirmaram que a distribuição diamétrica é uma das ferramentas utilizadas para a compreensão da sucessão permitindo, segundo Siminski et al. (2004) a avaliação prévia de condições dinâmicas da floresta, possibilitando previsões quanto ao desenvolvimento da comunidade vegetal.

Para Scolforo et al. (1997), a partir da estrutura diamétrica pode-se utilizar o conceito de floresta balanceada por meio da identificação de classes em que existe déficit ou superávit de árvores; já De Liocourt (1898) demonstrou que a curva normal da distribuição diamétrica de uma floresta ineqüiânea corresponde a uma progressão geométrica decrescente, conforme descrito por Assmann (1970); ainda dentro deste contexto, vários autores (De Liocourt, 1898; Meyer, 1952; Assmann, 1970; Vale, 1977; Campos et al., 1983; Della-Bianca & Beck, 1985; Sterba, 2004; Souza et al., 2006), salientam que a curva de distribuição de diâmetros dos indivíduos arbóreos de uma floresta apresenta uma distribuição exponencial negativa, assemelhando-se à forma de J-invertido, em que a maior freqüência de indivíduos se encontra nas classes de diâmetros menores.

Em virtude de determinar a forma da curva da distribuição diamétrica, o quociente "q" de De Liocourt permite também fazer inferências sobre o recrutamento e a mortalidade em comunidades vegetais (Felfili et al., 1998) pois, se houver uma razão constante entre as classes, significa que a taxa de recrutamento é similar à taxa de mortalidade e a distribuição pode ser considerada regular ou equilibrada.

Na parte sul da Zona da Mata de Pernambuco se encontram fragmentos de floresta, sobretudo em cumes de elevações (Ranta et al., 1998) cercados por uma matriz de cana-de-açúcar, na quase totalidade das ocorrências.

Propôs-se, aqui, analisar a estrutura diamétrica do componente arbóreo de um fragmento de Floresta Atlântica inserido em matriz de cana-de-açúcar, localizado no município de Catende, Pernambuco, com base no quociente "q" de De Liocourt.

MATERIAL E MÉTODOS

O estudo foi realizado no fragmento de Floresta Atlântica, no município de Catende, PE, denominado Mata das Caldeiras (Figura 1), situado na Mesorregião da Mata Pernambucana, mais precisamente na Microrregião da Mata Úmida, a 142 km de Recife. A área fragmento mede 38,56 ha, altitude 327 m, coordenadas: 8º 63' 59" S e 35º 77' 74" W. O relevo predominante varia entre ondulado a fortemente ondulado; o fragmento se encontra próximo a uma pequena comunidade, circundado por uma matriz de cana-de-açúcar, localizado no topo de um morro, sofrendo influência direta da borda. Os solos predominantes na área geográfica do município, são Latossolo Vermelho Distrófico e Nitossolo Vermelho associados ao Latossolo (EMBRAPA, 2005). O clima é do tipo As' tropical chuvoso com verão seco e estação chuvosa adiantada para o outono, antes do inverno, segundo a classificação de Köpper. A temperatura média anual supera os 22 ºC e a precipitação média anual é de 1.414 mm (CONDEPE, 1987). A vegetação é do tipo Floresta Ombrófila Aberta (Franke et al., 2005).


Para o levantamento foram alocadas, sistematicamente, 40 parcelas permanentes de 250 m2 (10 x 25 m), distanciadas entre si 25 m, e amostrados todos os indivíduos arbóreos vivos com Circunferência a Altura do Peito (medida a 1,30 m do solo) - CAP ³ 15 cm, que tiveram anotados, além do CAP, a altura total, o nome vulgar e as características dendrológicas, a fim de facilitar a identificação do material botânico coletado, através de consultas a especialistas e literatura especializada.

Os indivíduos amostrados foram distribuídos em classes de diâmetro com amplitude de 5 cm (Ferreira & Vale, 1992), tendo como centro da primeira classe o valor de 6,5 cm.

Após a distribuição dos indivíduos nas classes diamétricas determinadas, a freqüência dos diâmetros foi ajustada por meio da função de distribuição, utilizada por Campos et al. (1983), Eq. 1.

(1)

em que:

Ln y - logaritmo natural da média da freqüência por classe de diâmetro, amplitude de 5 cm, por hectare. Quando observada a inexistência de indivíduos em alguma das classes, somou-se o número 1 como constante a todas as classes, de modo a viabilizar o cálculo

X - centro de classe de diâmetro

b0, b1 - parâmetros que exprimem a estrutura da vegetação em relação à distribuição dos diâmetros

ei - erro aleatório

Com base na função de distribuição ajustada, obteve-se o quociente "q" intrínseco da vegetação, por meio da Eq. 2.

(2)

em que se utiliza a razão entre as freqüências de uma classe de diâmetro qualquer (Xi) pela freqüência imediatamente acima (Xi+1).

Também se analisou a distribuição diamétrica das seis espécies de maior Valor de Importância (VI) que, juntas, representam 36,27% deste valor (Tabela 1).

Thumbnail

Os dados da distribuição diamétrica e do VI foram obtidos do estudo de Costa Júnior et al. (2008).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A distribuição diamétrica do fragmento (Figura 2) comportou-se como o previsto para florestas ineqüiâneas, em razão de apresentar curva de distribuição diamétrica assemelhando-se a um J-invertido (De Liocourt, 1898; Meyer, 1952; Campos et al., 1983; Della-Bianca & Beck, 1985; Graz, 2004; Machado et al., 2004; Austregésilo et al., 2004; Sterba, 2004; Souza & Souza, 2005).


A primeira classe de diâmetro, com até 9 cm de DAP, apresentou 496 indivíduos, totalizando 47,28% da amostra. Tal ocorrência na estrutura diamétrica da floresta indica tendência de distribuição balanceada, em virtude da capacidade de regeneração das espécies vegetais (Souza & Souza, 2005); entretanto, a grande quantidade de indivíduos nas classes de menor diâmetro pode indicar que o regime de perturbação é relativamente intenso e contínuo (Machado et al., 2004).

O fragmento apresentou um "q" estimado de 1,26. Apesar da distribuição diamétrica possuir semelhança à forma de J-invertido, não se mostra balanceada (distribuição na qual o fator de redução do número de indivíduos de uma classe para a seguinte é constante), ou seja, a constante "q" de De Liocourt (observado) não permanece igual nas classes diamétricas do povoamento. De acordo com Nunes et al. (2003), a grande quantidade de indivíduos pequenos e finos pode indicar a ocorrência de severas perturbações no passado; nesse sentido, Martins (1991) advertiu que a maior densidade de indivíduos menores não indica ausência de problemas de regeneração, devendo ser considerada com cautela, demonstrando a necessidade de uma análise mais detalhada, em nível específico e com um grupo maior de espécies, para permitir interpretações mais seguras sobre as distribuições diamétricas.

Analisando-se as espécies de maior VI (Figura 3), observou-se que a distribuição diamétrica só não se assemelhou a um J-invertido em função de algumas espécies nas primeiras classes apresentarem menor número de indivíduos que a classe seguinte, como no caso da Tapirira guianensis (Figura 3A).


Machado et al. (2004) relacionaram a dificuldade de algumas espécies em recrutarem novos indivíduos nas classes de menor diâmetro com fatores inerentes à fragmentação: como agentes dispersores, forma e tamanho das áreas.

A espécie Plathymenia foliolosa (Figura 3E) demonstrou descontinuidade na distribuição diamétrica, em mais de uma classe e/ou, em classes sucessivas, podendo indicar que alguns locais sofreram alterações na sua estrutura pelo corte seletivo de árvores de menor porte, para a produção de energia, fato também verificado por Graz (2004) e Oliveira et al. (2005), o que vem corroborar com as evidências de exploração madeireira no fragmento constada por Costa Júnior et al. (2007, 2008).

As distribuições apresentaram déficit de árvores em pelo menos uma classe diamétrica, tanto no fragmento como um todo ou quando analisadas apenas por espécie, demonstrando que não se encontram balanceadas. Paula et al. (2004) afirmaram que, se as classes diamétricas se apresentarem interrompidas ou truncadas, significa que o ciclo de vida da espécie não se está completando; no entanto, Felfili (1997) comentou que, geralmente, essas variações são relacionadas à ecologia populacional de cada espécie e, na maioria dos casos, o que se observa é a existência de grandes descontinuidades ou achatamentos nas distribuições chegando, por vezes, à ausência quase que total de indivíduos jovens em algumas espécies.

Com relação à distribuição diamétrica das espécies, observa-se que a taxa de recrutamento não está compensando a mortalidade de algumas espécies, o que pode gerar a extinção local de um grupo de espécies no fragmento, corroborando com Felfili (1997) e Nascimento et al. (2004) os quais verificaram que a discrepância entre as taxas de mortalidade e o recrutamento pode levar a mudanças na estrutura da floresta; ressalta-se ainda, que, de acordo com Felfili (1997) as espécies requerem escala espacial e temporal muito ampla para atingir o equilíbrio entre mortalidade e recrutamento.

CONCLUSÕES

1. No fragmento Mata das Caldeiras, a estrutura diamétrica tende à distribuição balanceada, não ocorrendo para algumas espécies analisadas individualmente.

2. Por meio da distribuição diamétrica e dos valores de q obtidos, para o estágio de sucessão em que se encontra a área, pode-se inferir que o grau de perturbação nesses fragmentos ocorre de forma constante.

3. Tapirira guianense apresentou dificuldades na taxa de recrutamento, enquanto Plathymenia foliolosa apresentou descontinuidades acentuadas na estrutura diamétrica.

AGRADECIMENTOS

Ao CNPq, pelo financiamento da pesquisa Edital Universal 2003, pela bolsa de mestrado concedida ao primeiro autor, e de produtividade dos secundo e terceiro autores. Aos revisores anônimos, pelas sugestões e contribuições.

LITERATURA CITADA

Protocolo 097.07 - 20/06/2007

Aprovado em 15/10/2008

Referências bibliográficas

Datas de Publicação

Histórico

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