em

Brasil: Debate Sobre a Maioridade Penal

PDPics / Pixabay

As grandes crises comportam grandes decisões. Oportunidade! Que bom é o debate! Controvérsias… Informações… Formação de opinião! Você já se posicionou?

PDPics / Pixabay

Acredita que a redução é o caminho mais adequado para garantir uma sociedade mais justa e segura? Acha que todos os adolescentes estão ficando cada vez mais violentos e perigosos? Percebe o adolescente infrator como um sujeito em desenvolvimento? Somente o vê como um adolescente em conflito com a lei?

Já ponderou sobre qual o efeito real que a diminuição da idade penal pode ter na redução da criminalidade e na melhoria da vida das pessoas? Seu filho deve ir para prisão?

A medida socioeducativa o está fazendo reparar o ato infracional? O cumprimento o está ajudando a corrigir a rota e ter um projeto de vida? Você tem aberto a sua boca para defender suas ideias e participar deste momento tão delicado e importante às nossas crianças e adolescentes?

Já sabemos que a adolescência – como fase do desenvolvimento ou como segmento social – inquieta e incomoda. Lança um desafio ao mundo adulto que exige enfrentamento.

Desacomoda-nos. Temos que nos ocupar em solucionar o impasse do desenvolvimento: vida ou morte.

O adolescente busca expressar aquilo que não se espera e do modo que lhe é possível. Denuncia desesperadamente que as coisas não estão indo bem. Ao mesmo tempo rompe com o papel de mudança que dele se espera e expõe a desigualdade e a falta de perspectivas próprias da sociedade atual.

Com essas considerações, podemos entender que as atitudes de violência dos adolescentes expressam algo que não é verbalizado. O comportamento equivocado busca comunicar o desconforto e o sofrimento. Não podemos considerar de forma unilateral, como algo que lhe é singular, pessoal e esquecermos a relação, não podemos desconsiderar o contexto atual e muito menos a nossa responsabilidade.

Assim, nossa sociedade, num ritmo frenético e maníaco, evidencia incertezas e dúvidas. Confusão. Corrupção. Impunidade. Um mundo que valoriza o ter ao ser, onde os valores morais, éticos estão subjugados pelo consumismo, oportunismo, à beleza e a outros valores efêmeros.

Uau! Como isto reflete em quem está em desenvolvimento? E mais, encontramo-nos diante de uma adolescência cada vez mais precoce. Assim, creio que a solução para a violência e criminalidade é muito mais complexa e sofisticada. Sobretudo, requer muitas ações, em prioridade, em nosso mundo adulto caótico em autoridade (Autoridade é saber fazer, orientar e dar modelo).

Aliás, não passa pelo massacre de nossos jovens e crianças, principalmente, dos menos favorecidos. Precisamos investir em adoção de medidas profiláticas no meio social, começar muito cedo, desde o bebê. Evitar as causas… Família, Estado, Escola, Sociedade Organizada… todos terão que fazer a diferença em prevenção.

Desde 2006, ora Americana ora SBO, trabalho com adolescentes e famílias em cumprimento de medidas socioeducativas. Sei o quanto os casos são individuais e o quanto cada adolescente é único.

Entendo que as práticas de ato infracional pelos jovens são sintomas. São sinais que denunciam uma demanda afetiva que não tem encontrado lugar para elaboração. Faltam amor e frustração adequados e em sintonia. Também, podem expressar a incredulidade quanto às instituições e ao que o futuro reserva.

Vejo muitos em pleno vir a ser. Requerem verdadeiros e intensivos programas de acolhimento, proteção e educação que favoreçam o crescimento, o pleno desenvolvimento e o ingresso no mundo adulto. Infelizmente, ainda há muito previsto em lei, no discurso, no papel, mas na prática… No entanto, a simples privação de liberdade não possui caráter educativo, o que significa que apenas a internação não é uma medida capaz de evitar que o adolescente pratique novas infrações.

Na adolescência a elaboração psíquica ainda é muito frágil. O sujeito vai da situação para o ato muito rápido. Aí vem briga na escola, a briga com a família, atos que não serão vistos como tão problemáticos, mas também poderá ocorrer o ato infracional. No momento em que um adolescente comete um ato infracional, seja o mais simples que for ele tem que receber uma medida correspondente que o responsabilize.

Esta medida deve respeitar as peculiaridades dessa etapa de vida, pois a inimputabilidade penal não significa impunidade. Ainda, mais importante é oferecer espaços para que o adolescente se expresse e, de fato, possa elaborar informações, limites, interdições e normas de convívio social.

Nessa fase, ele também vive um processo de desligamento da família e passa por um grupo que lhe dá certa identidade. Se ele for mandado para uma penitenciária, que grupo será esse? Colocar um adolescente na prisão é aborto ao desenvolvimento. Se a medida for bem aplicada e se, em torno do adolescente, tiver um conjunto de políticas públicas para ele e sua família, é possível diminuir em grande escala a ocorrência de atos mais graves. O apoio emocional para o fortalecimento de suas relações consigo mesmo, com sua família e com a sua comunidade é essencial.

E nesse sentido, é também imprescindível que se crie uma rede de apoio ao adolescente na família e na comunidade, pois são os vínculos que contribuirão para evitar que a reincidência aconteça. E essas medidas devem ser tomadas não apenas com o objetivo de tornar esses adolescentes úteis e adaptados ao mundo de fora, mas como forma de reconhecer todos os direitos inerentes à pessoa humana.

Só assim será possível assegurar as oportunidades e facilidades necessárias para o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade, de modo que passem de cidadãos de papel a cidadãos de fato.

Os casos que repercutem na mídia e inflamam o clamor da população diz respeito a atos de extrema crueldade que sugeririam a existência de casos de psicopatia ou sociopatia entre adolescentes. Quando há casos graves, violentos e hediondos, que são minoria, a Psiquiatria não se furtou de opinar.

Sabe-se que os adolescentes que são portadores de distúrbios psiquiátricos podem beneficiar-se de medicações, já os psicopatas são refratários à medicação.

Por outro lado, concordo que adolescentes com transtornos de personalidade com um padrão de desconsideração e violação dos direitos dos outros não irão, em apenas três anos, recuperar-se dessa estrutura doentia de personalidade. Estes requerem um tratamento socioterápico de longa duração em meio apropriado. O custo alto é um investimento pequeno diante dos resultados sociais.

Concordo que os três anos de internação de menores com delitos graves são insuficientes para mudanças. Há 21 anos pratico a psicologia e psicanálise.

Portanto, aprendi que para mudar padrões de conduta, de valores e levar o indivíduo a poder administrar seus impulsos agressivos e libidinosos, bem como se conscientizar de sua capacidade de construir e destruir relações pode-se levar mais de uma década nos casos de sucesso terapêutico.

Contudo, o próprio SINASE já prevê o que deve ser feito nessas circunstâncias, orientando que, no caso de um adolescente apresentar indícios de sofrimento mental, ele deverá receber tratamento de acordo com as disposições da Lei 10.216 de 2001 (Lei de Reforma Psiquiátrica), que não descarta a possibilidade de internação compulsória a pedido judicial.

Concluo que abrir as portas da prisão a jovens menores de 18 anos é fechar as portas não somente para o seu próprio desenvolvimento, mas também para o País. Há que ter competência na contínua avaliação e saber distinguir cada psicodinâmica individualmente.

Atacar o indivíduo, desconsiderando as causas da violência e da criminalidade, é a resposta irracional a um apelo da sociedade de caráter mais amplo por justiça social. Chega de desigualdades marginalizadoras, injustiça e exclusão social. A diminuição da maioridade penal pura e simplesmente não resolverá o problema da insegurança e agravará a criminalidade.

Nesse sentido, faço coro que cabe exigir do Estado a urgente pratica das medidas socioeducativas e o investimento em educação de qualidade, além de medidas que eliminem as desigualdades sociais. O próprio ato infracional é, portanto, um indicador de que o Estado, a sociedade, a escola e a família não têm cumprido adequadamente seu dever de assegurar, com absoluta prioridade, os direitos da criança e do adolescente.

Creio a prioridade ainda consiste na aplicação efetiva do que está na lei. Temos urgente que estruturar o sistema socioeducativo. Um sistema que ofereça medidas de meio aberto e medidas de meio fechado, com infraestrutura, com recursos humanos bem dimensionados, preparados e valorizados. E essas medidas têm que ter uma proposta pedagógica consistente.

Não adianta deixar o menino preso ou colocá-lo na liberdade assistida sem saber aonde queremos chegar. Temos que acompanhá-lo na escola, inseri-lo em atividades profissionalizantes, de esporte, cultura e lazer. Se investirmos efetivamente em políticas públicas, teremos transformação.

Educação, saúde, assistência, cultura para os nossos adolescentes! Cadeia não. Liberdade com responsabilidade: sem dúvida alguma Deus existe!!!

Texto enviado por Eliane Pereira Lima – Especialista em Psicologia Clínica, Organizacional e do Trabalho

Deixe uma resposta