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Por que os grevistas da polícia não têm voz nos noticiários? Uma nova Revolta da Chibata?

Policia

Em 1910, marinheiros que eram tratados como escravos pelos oficiais se rebelaram, tomaram conta de navios de guerra e apontaram as armas para o Rio de Janeiro, então capital do país. Encurralado, o governo aceitou assinar um acordo de rendição, mas, tão logo os insurgentes se entregaram, foram traídos e receberam punições cruéis. “Para mostrar quem manda nesta porra!” O evento ficou conhecido como a Revolta da Chibata porque queria-se o fim da punição usando esse tipo de chicote.

Hoje esses insurgentes, especialmente seu líder, são cantados em verso e prosa, aparecem como heróis lutando por uma causa justa nos livros de história. Ironicamente, essa revolta vira-e-mexe vira tema de desfile de escola de samba. Digo “ironicamente” porque estamos acompanhando o que parece ser uma nova revolta da chibata: governo e conglomerados de mídia calando a voz de grevistas que, como recurso de negociação na Bahia.

Os líderes são presos em presídios de segurança máxima e a sociedade é manipulada para se indispor contra o movimento. A posição dos grevistas não aparece diretamente. Na reportagem de hoje do Jornal Hoje só quem fala são os políticos e aqueles contrários à greve. A mensagem é: o movimento acabou, a polícia está nas ruas, a greve é ilegal, os líderes são vândalos e o Exército está ponto para agir. Só quem fala é o governo, não há outro lado.

Mas o outro lado resiste. Se a notícia oficial é de desmobilização, o movimento revive. Qual jornal noticiou que isso estava para acontecer? E qual é o ânimo das corporações nos outros estados do país? Há um grande silêncio, todos com medo de que a greve se alastre mais. 

O outro lado aparece apenas em massagens editadas para conter apenas partes específicas de conversas. (O áudio chega para quem? Para o Jornal Nacional…) O outro lado aparece também dentro de pequenas notas técnicas e desinteressantes: os grevistas querem isso, querem aquilo. PEC 300 para cá, reajuste para lá. Quantos espectadores entendem isso? O que quer dizer? Qual é a diferença entre o que eles pedem e o que é oferecido? E onde está o calor do grevista e da família do grevista tocando a sociedade com a força de sua raiva, de sua indignação?

Dá a impressão clara de ser uma operação abafa que tem por objetivo fazer de conta que nada está acontecendo.

É interessante ainda que não apareça nas reportagens a opinião pública. E eu suspeito que seja porque a sociedade está, apesar do silenciamento dos grevistas, resistindo a comprar a ideia de que os policiais estejam errados. Onde está o instituto de pesquisa colhendo o ponto de vista da sociedade? Onde está essa informação nos noticiários? Apesar de acharem errada a estratégia dos grevistas, tenho a impressão de que a maioria dos brasileiros simpatiza pela causa dos policiais e bombeiros.

Um taxista resumiu assim a sua percepção dessa história: “os deputados não fazem greve porque eles mesmos se dão aumentos…” O policial não pode se dar aumento nem pressionar o poder público quando a via da negociação não funciona.

Fiquei me lembrando da música dos Titãs. O refrão pergunta: polícia, para que precisa? Aparentemente precisamos muito, mas, se precisamos, por que não dar melhores condições. Agora os papéis se inverteram: são eles que estão em posição de fragilidade frente a esses interesses de poderosos e é a vez de a sociedade se manifestar para proteger os manifestantes e defender o direito de se ter mais paz e segurança no país.

P.S. Os jornais ficam anunciando o número de mortes e crimes na Bahia desde o início da greve. É para, subliminarmente, colocar a sociedade contra os grevistas?

P.S.2 Eu tenho família morando na Bahia e eles estão surpresos com o peso das tintas usadas para pintar a situação no estado. Parece que na TV o problema é muito maior do que nas ruas. É o espetáculo da notícia ou outro indício de manipulação da opinião pública.

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